Fabio Caversan e Marco Stefanini (*)
Muito tem se falado sobre a perda, ou não de empregos com ascensão de novas tecnologias e algoritmos de Inteligência Artificial, cujo desenvolvimento certamente vai continuar acelerado.
O que podemos dizer é que, antes de ser um substituto para a capacidade humana, a Inteligência Artificial funciona como um catalisador que permite utilizar as melhores características das pessoas que trabalham conosco, estendendo sua capacidade e eficiência, um conceito que internacionamente começa a ser chamado de human augmentation.
De maneira simples, robôs são excelentes para tratar e entender padrões. Tudo que funciona sempre ou na maioria das vezes de determinada forma pode ser tratado por eles. Não tem tanto a ver com o número de passos que compõem um processo, mas sua homogeneidade.
Já humanos são excelentes em soluções criativas, em tratar exceções, em estabelecer laços e gerir crises. Porém, se sentem sobrecarregados e cansados quando obrigados a tratar de processos repetitivos.
É um pouco como os heróis de filmes, mas ao invés de armaduras inteligentes, usamos robôs capazes de processar linguagem, ler textos, avaliar dados. Estas ferramentas especializadas realizam a parte pesada e tediosa de qualquer trabalho administrativo ou de atendimento: entender, classificar, filtrar, encaminhar. No final, pessoas de carne e osso realizam a parte mais nobre das tarefas: tomar decisões, criar soluções, resolver problemas, priorizar demandas.
O uso massivo de IA em nossas operações não causou desemprego ou redução em nossas equipes. Em média, continuamos com mais de 600 vagas abertas todos os meses. Mas gerou – e continua gerando – uma revolução em eficiência. Fazemos mais coisas com mais velocidade e eficiência, reduzindo a quantidade de erros e de retrabalho, permitindo que cérebros eletrônicos e humanos façam, cada um, o que de melhor têm a oferecer.
A médio e longo prazos, sabemos que esse aumento de eficiência gera mais negócios, que, por sua vez, geram mais empregos.
O mercado avança o suficiente para saber que o melhor uso de qualquer tecnologia sempre é inclusivo, e não paramos de encontrar mais maneiras de utilizar esses recursos em monitoramento ativo e inteligente, em predição, recomendação e segurança.
É importante acrescentar que investimentos em IA, para funcionar, precisam ser consistentes e contínuos. Foi-se o tempo em que se prometia uma caixa mágica, uma bala de prata que rapidamente resolveria uma séria de problemas.
A Inteligência Artificial depende de conhecimento de processos e modelagem de dados, implementação paciente e ajustes contínuos. Se for assim, os resultados são cumulativos e tendem a acelerar, ao longo do tempo, gerando vantagens competitivas reais.
Longe de ser uma ameaça, a IA é uma oportunidade real que pode ajudar o Brasil a iniciar um novo ciclo de crescimento e eficiência. Segundo dados da Fortune Business Insights, a capacidade de explorar as soluções de Inteligência Artificial está diretamente relacionada ao crescimento da economia. A expectativa é de que o mercado de IA chegará a US$ 203 bilhões até 2025.
Um levantamento realizado em 2018 pelo Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) estima que a América Latina como um todo poderia, nos próximos anos, ampliar seu PIB de 3% para 4% ao ano. O crescimento do PIB do Brasil, em 2020, por exemplo, está sendo estimado em 2% – dado do FMI divulgado em novembro de 2019. De acordo com o BID, esse índice poderia avançar até 4,1% com a disseminação da IA pelas várias verticais da economia e várias regiões do Brasil. Vale destacar que mais da metade desses ganhos seriam proporcionados pelo aumento da produtividade das empresas – um dos pontos mais vulneráveis da economia brasileira.
Neste novo cenário é preciso investir na transformação da educação. A China, por exemplo, lançou em 2017 um programa de incentivo ao desenvolvimento de novas gerações de IA. Nessa jornada, o governo chinês acena com isenções em impostos para empresas que desenvolvem soluções de IA para escolas (níveis fundamental e médio). Uma das demandas é complementar, com soluções de IA, a falta de professores para atender toda a população chinesa.
A Índia, por outro lado, já conta com dezenas de startups focadas em IA para o setor educacional. As soluções identificam os conteúdos que o aluno não conseguiu aprender em sala de aula e, a partir daí, desenham programas automatizados de ensino sob medida para a demanda desta criança.
Portanto, o futuro da educação está em sua continuidade durante toda a vida. Na era da digitalização, criar mais, propor e se expor mais farão a diferença. E todo esse preparo deve começar no ensino básico, valorizando a pesquisa e a descoberta desde cedo.
Para fazer esta roda girar, o professor deve estimular o debate para que as crianças aprendam umas com as outras e, ao mesmo tempo, sejam desafiadas a questionar e encontrar novas respostas. Neste cenário, a conectividade terá um papel imprescindível para levar informação às localidades mais remotas do Brasil. Com os dispositivos de IA e IoT, é possível preparar professores, compartilhar conhecimento e qualificar os profissionais das mais diversas áreas em tempo integral.
Com as plataformas digitais disponíveis e com o crescimento econômico estimado nos próximos anos, novos empregos deverão ser criados, mesmo que alguns desapareçam em função da automação. Vivemos a era em que a força de trabalho e o conhecimento tendem a se reinventar pela tecnologia. A Inteligência Artificial certamente é – e será cada vez mais – uma das principais protagonistas dos novos tempos modernos.
(*) Fábio Caversan é diretor de P&D em Inteligência Artificial da Stefanini EUA. Marco Stefanini é fundador e CEO global da Stefanini.