Aliciamento na web para o tráfico de pessoas é discutido na Secretaria da Justiça

Talk show na Secretaria da Justiça e Cidadania debate formas de combater o aliciamento na web para o tráfico de pessoas

     A Associação Brasileira de Defesa da Mulher, da Infância e da Juventude (Asbrad), com o apoio do Núcleo de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas da Secretaria da Justiça e Cidadania, promoveu, na primeira semana de agosto, um talk show para debater formas de enfrentar e combater o aliciamento na web para o tráfico de pessoas. As discussões ocorreram no Auditório Espaço da Cidadania André Franco Montoro na sede da Pasta, em São Paulo.

    Para tratar da vulnerabilidade dos usuários na web um grupo de estudantes da Fatec de Americana, com a parceria da Asbrad, criou um site fake com ofertas de emprego para jovens. Durante 11 dias, o portal recebeu 82 inscrições, sendo que a maior procura foi para vagas de jogador de futebol (39 inscrições), seguida de oportunidades para trabalhar em navios cruzeiros (28 inscrições). Desse total, 70% das inscrições foram feitas por mulheres e 30% por homens. Sessenta por cento dos inscritos declararam ter renda familiar de até 2 salários mínimos e 38% até 4 salários mínimos.

    Segundo a defensora dos direitos humanos e presidente da Asbrad, Dalila Maranhão Dias Figueiredo, as discussões que tratam desse tema precisam chegar aos locais de baixa renda para proteger as pessoas mais vulneráveis à atuação dos aliciadores cibernéticos.

    Após a inscrição, os interessados foram informados que participaram de um experimento social, e que haviam sido selecionados para colaborar com a prevenção ao tráfico de pessoas. Esse projeto foi inscrito e venceu o desafio IBM Bluehack 2018, uma maratona de programação que utiliza a tecnologia para criar soluções em benefício da sociedade. Os alunos Daniel Zampelin, Eduardo Watanabe, Maiara Martins e Rebecca Barbosa são os desenvolvedores do site.

    O secretário da Justiça e Cidadania, Paulo Dimas Mascaretti, explicou que a Pasta está comprometida com o tema e por meio do Núcleo de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas intensificou suas atividades para combater as violações dos direitos humanos. “Precisamos implantar políticas públicas para combater o aliciamento cibernético para o tráfico de pessoas. Conto com a expertise das pessoas que participaram desse evento para avançar”, afirmou.

Mesas de debate

    O talk show teve duas mesas de debate. A primeira discorreu sobre o tema “Estamos Todos Vulneráveis ao Crime Cibernético?”, mediada pela coordenadora da Asbrad Graziella do Ó Rocha, e a segunda, mediada pelo coordenador do Núcleo de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas, Ricardo Alves, abordou o assunto “Como Atuar no Mundo da Web na Prevenção e Repressão ao Tráfico de Pessoas?”.

   O customer success manager da IBM Brasil, Felipe Prado, falou sobre a facilidade com que hackers obtêm os dados pessoais dos usuários, por meio de correntes que circulam em e-mails, mídias sociais e aplicativos, como o de envelhecer, que virou febre em todo mundo, e que tem preocupado as autoridades de segurança dos Estados Unidos. “A segurança na internet nada mais é do que conscientização da segurança da informação. É preciso estar atento ao que se faz na rede, atualizar os dispositivos, não abrir mensagens suspeitas, mas infelizmente falta muita conscientização”, disse.

   A coordenadora da Área de Desigualdades e Identidades da Interlab, Natália Neris, apresentou dados da violência de gênero e a pornografia on-line não consentida. “Para cada violação dos direitos humanos existe uma legislação específica. Hoje, não existe mais a separação do mundo on-line e off-line, a grande questão é a aplicação da legislação e não sua ausência”, pontuou.

   A coordenadora Nacional de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas do Ministério da Justiça, Renata Braz Silva, afirmou que a lei de enfrentamento ao tráfico de pessoas de 2016 trouxe avanços importantes, mas é preciso implantar medidas de prevenção, campanhas de conscientização e envolver a sociedade para debater o problema.

     Para o delegado da PF William Tito Schuman esse tipo de crime tem uma conotação diferente, pois muitas vezes as pessoas não se enxergam como vítimas. “No tráfico para exploração sexual as vítimas tendem a ter um discurso de que vão sair do país para melhorar de vida. Infelizmente, elas só descobrem a realidade quando é tarde. Nesses casos, as dificuldades são maiores para chegar à resolução ou até mesmo propiciar o retorno dessas pessoas”, comentou.

    O delegado explicou que é preciso escutar a vítima, não apenas ouvi-la formalmente no inquérito policial. Segundo Schuman um trabalho eficiente precisa envolver o preparo do policial, do delegado e contar com o acompanhamento de instituições e de profissionais da área de Psicologia para esclarecer a vítima sobre a real situação. 

    A coordenadora do Grupo de Apoio ao Combate à Escravidão Contemporânea e ao Tráfico de Pessoas do MPF, Adriana Scordamaglia, acrescentou que é necessário implantar um banco de dados com informações conjuntas entre instituições para que as operações sejam bem-sucedidas.

Números

Em julho de 2019, a Ouvidoria Nacional dos Direitos Humanos do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos divulgou o balanço anual do Disque 100 referente ao tráfico de pessoas no Brasil. Em 2018, foram registradas 159 denúncias, em São Paulo foram 36.

    Os dados apontam as violações mais registradas durante 2018, entre elas: tráfico interno para exploração sexual (16,9%), internacional para exploração sexual (8,1%), interno para adoção (7,5%), interno para exploração de trabalho (6,9%), internacional para exploração de trabalho (5,0%), internacional para adoção (2,5%), internacional para remoção de órgãos (1,8%) e, por fim, interno para remoção de órgãos (0,63%). Outros representam 57,23% das violações.

       Entre as vítimas 53,1% são do sexo feminino, seguidas por sexo masculino (11,7%), e de sexo não informado (35,14%). O balanço também informou o percentual de vítimas com idade entre 15 a 17 anos (18,9%), 0 a 3 (7,2%), 25 a 30 (6,31%), 12 a 14 (4,50%), 18 a 24 (3,6%) e recém-nascido (1,8%). Desses, 54,9% não informaram a faixa etária.

      Estima-se que o tráfico de pessoas movimenta 32 bilhões de dólares anualmente, e ocupa a segunda atividade ilícita mais lucrativa do mundo, perdendo apenas para o tráfico de drogas e armas em termos de rentabilidade, segundo o último relatório da Organização Internacional do Trabalho (OIT) Brasil.

Denúncias

     As denúncias relacionadas ao tráfico de pessoas podem ser feitas no Disque 100. As embaixadas podem ser contatadas pelas vítimas. As denúncias também podem ser feitas no Núcleo de Enfretamento ao Tráfico de Pessoas na Secretaria da Justiça, no Pátio do Colégio em São Paulo, no sitewww.ouvidoria.sp.gov.br ou nos telefones (11) 3241-4718/4291.

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