O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) completa 31 anos neste 13 de julho. A Lei nº 8.069/1990 foi um avanço social fruto da luta de diversos atores do movimento pelos direitos de meninos e meninas – movimentos sociais, juristas, Ministério Público, Poder Judiciário, Defensoria Pública, servidores públicos, dentre outros.
Só que o ECA, na realidade, foi o segundo passo, pois é uma lei que regulamentou os artigos 227 e seguintes da Constituição Federal, quando, pela primeira vez na história do Brasil, todos aqueles com menos de 18 anos passaram a ter direitos constitucionais, tornando-se cidadãos e pessoas com dignidade humana, dois dos cinco fundamentos da nossa República Federativa.
Ao longo da história constitucional brasileira, crianças e adolescentes, em geral, estiveram à margem. Quando lembradas, ou era na regulamentação do seu trabalho ou exclusivamente na assistência social, com foco exclusivo naquelas em situação de pobreza e à margem social.
Foi com a participação da sociedade, durante o processo constituinte, entre 1986 e 1988, que emendas populares foram propostas, os anseios sistematizados pela comissão constituinte, os parlamentares votaram pela aprovação e os direitos infanto-juvenis foram inseridos na Constituição, promulgada em outubro de 1988.
Trata-se de um ensinamento do passado para o que vivemos hoje. O cidadão e a cidadã participaram diretamente do processo de construção de uma Carta Magna, elegeram os representantes que a aprovaram e, com isso, concederam a crianças e adolescentes algo tão básico e inerente a qualquer ser humano detentor de direitos, que ilustra a importância ainda maior da defesa da democracia brasileira e do Estado de Direito.
No artigo 227 da Constituição, a família, a sociedade e o Estado, por ordem, foram convocados a assegurar a proteção integral a meninos e meninas, além de lhes garantir os mesmos direitos que já haviam sido dados aos adultos, mas até então a eles lhes eram negados, como o direito ao contraditório e à ampla defesa e, consequentemente, a igualdade perante à lei.
O inciso IV do artigo é enfático ao afirmar a “garantia de pleno e formal conhecimento da atribuição de ato infracional, igualdade na relação processual e defesa técnica por profissional habilitado”, sendo sua regulamentação presente, principalmente, no ECA e, anos mais tarde, no Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo (Sinase).
Com isso, a doutrina da situação irregular do antigo Código de Menores, em que os adultos, por meio do sistema de Justiça – aqui representado pelos três poderes da República -, decidiam sobre o destino daqueles que não se “enquadravam”, foi substituído pela doutrina da proteção integral.
A evolução legislativa separou o atendimento dos “carentes” e dos “delinquentes”, assim denominados na legislação anterior, nas fundações estaduais para o Bem-Estar do Menor. A Fundação CASA acompanhou a mudança e, três décadas mais tarde, observa que a aplicação da medida socioeducativa é responsabilidade de um sistema e da sociedade, não só do Poder Executivo.
Hoje, nos 124 centros socioeducativos espalhadas por todo Estado de São Paulo, da nossa Fundação CASA, são atendidos 5.221 mil jovens, de ambos os sexos, e são referências para outros estados da Federação e até para outros países. Cumprindo integralmente o que está previsto no ECA e no Sinase, em todos os centros os adolescentes têm uma agenda multiprofissional que inclui atividades de escolarização formal, esporte, cultura, educação profissional, além do atendimento de psicólogos e assistentes sociais.
Na Fundação CASA, os adolescentes têm atenção integral aos seus direitos enquanto cumprem a medida socioeducativa em regime fechado. O desafio e apoio que buscam está fora dos muros, em uma sociedade que deve acolher e oferecer ferramentas para se manterem no caminho do bem.
Fernando José da Costa
Secretário da Justiça e Cidadania, presidente da Fundação CASA e diretor do Instituto de Medicina Social e Criminologia de São Paulo (Imesc)